*Cássio Faeddo
Não se eliminará o vírus com migalhas jogadas pela consciência pesada do Primeiro Mundo.
Projeções estatísticas apresentadas pela revista The Economist recentemente, indicam a possibilidade de termos até agora cerca de 12 milhões de mortes pela Covid-19, embora números oficiais indiquem 3 milhões de pessoas mortas.
Considerando as dificuldades de mensuração de mortos em países cujos níveis de desenvolvimento econômico e social são díspares, não se pode descartar que sejam números irrealistas.
É uma projeção impressionante e assustadora, pois são números em crescimento. Comparativamente, na Segunda Guerra Mundial, tivemos algo em torno de 70 a 80 milhões de mortos em um período aproximado de 6 anos.
Além das mortes relacionadas ao vírus, devem ser considerados outros fatores, como econômico e sociais. Estes causaram tantos óbitos por diversas outras razões indiretas à pandemia. Portanto, ainda não há como avaliar qual será o montante final de falecidos atingidos pela Covid-19 até que a pandemia arrefeça.
Mas como o mundo vai prosseguir com ou sem a presença do Coronavírus?
Certamente os países ricos conseguirão uma recuperação forte e consistente com a participação dos estados na economia, seja por meio de financiamentos, seja pela participação direta do estado na economia.
A repressão de consumo e demanda durante a pandemia, possivelmente será seguida por consumo de desforra. A pandemia não mudará de pronto a lógica de um mundo rico e desenvolvido focado em consumo.
Em uma guerra mundial, como na Segunda Guerra, houve um esforço de guerra que conduziu o crescimento econômico registrado durante o conflito – a exemplo dos EUA, que em 1942, atingiu 18,9% no PIB. Aliás, de 1939 até 1944 o PIB norte-americano sempre se situou acima de 8%.
Em uma pandemia ocorre de forma diferente, pois há muitos setores retraídos durante sua existência; o “esforço de guerra” tem como foco restringir a circulação do vírus e também a vacinação da população.
Essa estratégia afeta a cadeia de produção, bem como mantém negócios em um abre e fecha intermitente, enquanto não se aplica a vacina de forma considerável em todas as pessoas; isto é cruelmente impactante em países pobres cujas economias e receitas são fracas.
Países pobres, com instituições corrompidas e com crises humanitárias continuarão com esses status, com previsão de piora. A falta de recursos econômicos impede melhor combate ao vírus que deverá permanecer circulando por mais tempo.
Ainda que países como o Brasil retomem um pequeno crescimento do PIB com fundamento na exportação de bens da agropecuária e minérios, esse crescimento não é suficiente para distribuir renda para a população de forma geral, uma vez que concentrado nas mãos de poucos.
Pouco dinheiro que se esvai pelo ralo da corrupção, sistema de saúde precário e sobrecarregado, são algumas das mazelas de países pobres. Para esses países, a recuperação econômica demorará muito mais.
Entretanto, vírus com circulação local é ameaça global. Vírus não têm passaportes nem são deportados ao chegarem em uma praia europeia ou capturados ao ultrapassarem um muro no México para o EUA.
Não há saída para o mundo se não por meio de apoio aos países pobres e com dificuldades na área de saúde e de efetivo combate ao vírus.
Não se eliminará o vírus com migalhas jogadas pela consciência pesada do Primeiro Mundo. Estratégia de saúde global não é esmola.
Além do controle da pandemia, os países ricos devem considerar o radicalismo religioso, extremismo político, crise migratória, violência e terrorismo que se exacerbam em ambientes de escassez. Eliminar o vírus e amenizar crises humanitárias é, antes de tudo, um investimento para o Primeiro Mundo.
A solução para esta grave crise certamente passará em dar máxima importância ao apoio multilateral, seja na quebra temporária de patentes, seja na expansão do programa COVAX Facility, e também na ajuda humanitária às populações vulneráveis de forma ampla.
Mas, se não houver um sensível esforço global, ainda acompanharemos muitos danos relacionados ao irregular controle da pandemia no decorrer dos anos.
Cássio Faeddo. Advogado. Mestre em Direito. MBA em Relações Internacionais – FGV/SP