As novas regras do WhatsApp ferem sua privacidade?

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* Francisco Gomes Júnior

Está sendo anunciado para o dia 15 de maio o prazo final para aceitarmos as mudanças nos termos de serviço e na política de privacidade do WhatsApp. Essas mudanças, a princípio, afetam a privacidade dos usuários, ao permitir que os dados pessoais coletados no uso do aplicativo possam ser compartilhados com outras mídias sociais do mesmo grupo econômico, como o Facebook.

De acordo com os novos termos de uso, quem não concordar com esse compartilhamento terá sua conta no aplicativo bloqueada e para reativá-la deverá concordar com os termos propostos.

A proposta do WhatsApp afronta diretamente a LGPD (a Lei Geral de Proteção dos Dados), a lei que regulamenta como devem ser colhidos, armazenados, usados e excluídos os dados pessoais no país. De acordo com a legislação, dados pessoais somente podem ser utilizados mediante uma das hipóteses nela previstas. O uso de dados pessoais obedece ao princípio da autodeterminação informativa, ou seja, cabe a cada indivíduo gerir quando e por quem seus dados podem ser utilizados.

O consentimento do usuário, portanto, é fundamental para que seus dados possam ser compartilhados. O WhatsApp, aparentemente, não quer propiciar a escolha ao titular dos dados pessoais. Já existem questionamentos administrativos e de órgãos de defesa do consumidor sobre estes novos termos, mas até o momento não há indicativo de que o WhatsApp aceite negociar alterações para que se obedeça a LGPD e o direito de escolha do usuário.

Já no caso do Facebook, temos uma questão mais antiga. Como se sabe o Facebook coleta dados do usuário (até mesmo quando não se está usando o aplicativo). E em algumas situações comercializou esses dados para a utilização de outras empresas. O caso mais famoso foi o “Cambridge Analytica” , empresa que utilizou os dados obtidos no Facebook para estratégias eleitorais e interferências nas eleições americanas e no Brexit (a votação que retirou a Grã Bretanha da Comunidade Europeia).

O Facebook vem ao longo dos últimos anos sofrendo inúmeras acusações de utilização indevida dos dados e busca sempre celebrar acordos, pagando indenizações e multas para livrar-se de acusações mais sérias. Como a prática se repete, provavelmente as sanções não se mostram suficientes para exigir uma mudança de postura.

Dizendo combater essa prática abusiva de captura de dados, a Apple lançou a atualização de software (iOS 14.5) com a ferramenta App Tracking Transparency (ATT). Assim, os usuários de iOS (iphones, ipads) receberão uma notificação em forma de pop-up na tela sempre que acessarem aplicativos que coletam e compartilham dados com terceiros. Com isso, o usuário saberá quais aplicativos querem coletar seus dados e autorizará ou não essa operação. É uma prática aderente à LGPD.

A reação do Facebook a esta atualização da Apple foi forte. Alegando que esta restrição irá afetar seu modelo de negócio, o Facebook ameaça iniciar um processo judicial contra a Apple. Segundo o Facebook, esta limitação irá encarecer o custo da internet para o usuário final, já que muitos serviços online são gratuitos pois são financiados pela exibição de publicidade, realizada com a coleta dos dados.

A LGPD, como se sabe, trouxe uma série de regras para o tratamento de dados pelas empresas públicas e privadas, com o objetivo de dar garantias ao usuário de que seu direito a privacidade será respeitado. As empresas estão buscando implementar alterações sistêmicas e legais para aderirem à lei.

A credibilidade do sistema de proteção de dados será testada pelas próprias sanções que poderão ser impostas pela ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados). Como se tem visto, muitos vazamentos de dados têm acontecido de forma massiva pela invasão de sistemas de ministérios e empresas públicas. Espera-se que as sanções sejam aplicadas de forma isonômica para todas as empresas, sem privilégios a empresas públicas ou do Vale do Silício.

*Dr. Francisco Gomes Júnior: Advogado sócio da OGF Advogados, formado pela PUC-SP, pós-graduado em Direito de Telecomunicações pela UNB e Processo Civil pela GV Law – Fundação Getúlio Vargas.