*Luiz Felipe de Franco Lima e Vicente Piccoli M. Braga
Desde seu lançamento, em novembro de 2020, o Pix é um sucesso em transferências entre pessoas físicas, tendo assumido o posto de meio mais utilizado no Brasil, superando o TED e a DOC.
Por outro lado, o Pix ainda não é uma realidade para o varejo. Uma pesquisa do Ipec, encomendada pelo C6 Bank, mostrou que das 270 milhões de transferências realizadas por meio do Pix no mês de março, somente 11% foram realizadas para pagamentos a empresas. Em contrapartida, essa pesquisa demonstrou que 67% dos brasileiros usariam o Pix para pagar suas compras no varejo.
Devido a este cenário, o Banco Central do Brasil (“BCB”) vem anunciando novos produtos visando o fortalecimento do uso do Pix no comércio, como o Pix Cobrança, que se assemelha à figura boleto, e que, após alguns adiamentos, entrará em funcionamento ainda neste mês de maio.
Agora, nesta segunda-feira (10/05/2021), o BCB publicou a Consulta Pública nº 87, para escutar o mercado e a sociedade sobre a sua proposta de implementação de duas novas modalidades de produtos: Pix Saque e Pix Troco.
Conforme a Consulta Pública nº 87, a implementação desses produtos visa aumentar a capilaridade da oferta de saque, visto que os serviços de acesso a recursos em espécie ainda não estão presentes em muitas localidades, e também aumentar a competitividade, possibilitando que as fintechs não dispõem de presença física (a maioria) possam oferecer serviço de saque aos seus clientes.
Funcionamento dos produtos
Ambos os produtos visam oferecer ao cliente final a possibilidade de retirada de dinheiro em espécie por meio da utilização de uma transferência Pix, porém o que difere o Pix Saque do Pix Troco é o fato de o Pix Troco estar necessariamente atrelado a uma transação de compra e venda de um produto.
Portanto, no Pix Saque, conforme a figura abaixo, o cliente faz a transferência de uma quantia de sua conta à conta do agente autorizado a realizar prestar o serviço de saque e esse agente entrega a mesma quantia em espécie ao cliente.
No Pix Troco, por sua vez, o cliente, ao fazer a compra do produto, realiza a transferência via Pix de um valor superior ao preço do produto comprado, recebendo do lojista a diferença, em espécie. A dinâmica pode ser melhor visualizada na figura abaixo.
Detalhes operacionais
Essa diferenciação entre os produtos visa conferir maior flexibilidade aos agentes que quiserem oferecê-los, que poderão optar por oferecer somente um ou ambos aos seus clientes, conforme seu modelo de negócio.
Como as instituições financeiras não comercializam bens de consumo, não é possível que elas ofereçam o Pix Troco. Entretanto, elas poderão oferecer o Pix Saque aos seus clientes.
Para que o estabelecimento comercial possa oferecer aos seus clientes esses produtos, será necessário que firme contrato com participante do Pix. Ao firmar contrato, o estabelecimento comercial passará a ser visto pelo BCB como um “Agente de Saque”, que nada mais é que o estabelecimento que venha a estabelecer relação contratual com participante do Pix para a prestação dos serviços Pix Saque ou Pix Troco em nome desse participante.
Para que possa atuar na prestação de serviço do Pix Saque ou Pix Troco, o participante Pix deve se enquadrar na modalidade de provedor de conta transacional e ser instituição autorizada a funcionar pelo BCB. Sendo obrigatório o oferecimento desses serviços aos usuários pessoa natural, enquanto o oferecimento para pessoas jurídicas é opcional.
Os participantes que oferecerem serviços de Pix Cobrança por meio da API Pix a estabelecimentos comerciais serão também obrigados a ofertar as funcionalidades necessárias para a prestação dos serviços de Pix Saque e Pix Troco.
O BCB também propôs regras a serem cumpridas pelos Agentes de Saque para o oferecimento dos novos produtos, como por exemplo, limitar que a transferência de recursos se dê por meio de leitura de um QR Code ou por Pix Copia e Cola.
Além do dito acima, o Agente de Saque poderá também definir os valores disponíveis para saque, não podendo ser penalizado pela instituição participante do Pix que tenha parceria caso não tenha valores disponíveis.
O Agente de Saque também não poderá cobrar tarifas adicionais do cliente para realizar o serviço de saque. O BCB discutirá a possibilidade do repasse de parte da tarifa TIR recebida pela instituição participante do Pix ao Agente de Saque, como forma de remuneração pela prestação do serviço além do efeito esperado de maior tráfego de clientes.
Visando garantir a simetria com o serviço de saque tradicional, a instituição participante do Pix somente poderá realizar a cobrança de tarifas sobre o cliente a partir do quinto saque realizado a cada mês. Nesse sentido, embora o BCB não tenha proposto um limite à quantidade de saques que poderão ser efetuados, a proposta sugere limitar a R$ 500,00 por dia a quantia a que cada usuário terá acesso por meio de ambos os produtos, de forma combinada.
Benefícios esperados
Em suma, a implementação do Pix Saque e do Pix Troco busca beneficiar os clientes, disponibilizando mais opções de ponto de saque e visando maior conveniência e facilidade na realização desse tipo de transação.
Há uma expectativa de benefício também aos lojistas, que, justamente por serem vistos pelo BCB como realizando essa atividade apenas de forma complementar, terão como maior incentivo o aumento no fluxo de clientes que transitarão pelo seu estabelecimento, além de reduzir os custos com a gestão do numerário – evitando viagens ao e diminuindo a exposição dos estabelecimentos a furtos e roubos
Para os participantes do Pix, os produtos ampliam o leque de possibilidades das de instituições que não contam com agência física, pois com isso poderão oferecer o serviço de saque a seus clientes. Desse modo, esperasse que as fintechs possam expandir sua área de atuação para lugares do país onde a necessidade de utilização de dinheiro em espécie ainda é bastante relevante.
Por fim, cabe destacar que os interessados em contribuir com a Consulta Pública nº 87 poderão se manifestar até o próximo dia 9 de junho. Sendo que a implementação do Pix Saque e do Pix Troco está prevista para o segundo semestre deste ano, após o processamento das sugestões recebidas e o aperfeiçoamento das regras.
Autores: Luiz Felipe de Franco Lima e Vicente Piccoli M. Braga, sócios do FAS Advogados