Decisões do TST na pandemia: Lei de cotas de PCD

*Luiz Eduardo Amaral de Mendonça e Rosana Yoshimi Tagusagawa

Até mesmo as empresas que exercem atividades teoricamente mais difíceis de contratar pessoas com deficiência devem comprovar robustamente seus esforços para não serem condenadas em dano moral coletivo.

Um julgamento ocorrido durante o estado de calamidade pública por conta da pandemia relativa ao COVID-19 chamou a atenção, pois deu a entender que o TST havia revisto seu posicionamento majoritário relativamente à lei de cotas para pessoas com deficiência ou reabilitados, prevista no art. 93, da Lei nº 8.213/1991.

A notícia publicada em janeiro desse ano informou que uma empresa de ônibus foi condenada pela Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) ao pagamento de indenização por danos morais coletivos por não ter realizado todas as contratações necessárias ao cumprimento integral da cota de pessoas com deficiência e reabilitados, aplicável a todas as empresas a partir de 100 (cem) empregados.

A decisão do TST no processo nº 982-06.2015.5.02.0067 consignou que incumbe ao empregador promover a inclusão das pessoas com deficiência e reabilitados para a cota legal e, caso este não o faça, há dano à coletividade.

Vale aqui destacar que as empresas com mais de 100 (cem) empregados, além de pagar a multa administrativa, que já teve seu valor atualizado em 2021 – podendo chegar a R$ 265.659,51 por autuação, a depender do número de empregados em todo o território nacional -, ainda correm o risco de serem condenadas ao pagamento de indenização por danos morais coletivos.

De uma análise mais detalhada do acórdão, constata-se que a decisão se baseou no entendimento de que a empresa não demonstrou a real impossibilidade fática de cumprimento da cota, nem comprovou que suas tentativas para tanto foram infrutíferas.

Portanto, na verdade a notícia reforça a importância de as empresas organizarem e documentarem as ações e esforços realizados para a contratação de pessoas com deficiência e reabilitadas, bem como ações de sensibilização interna e inclusão dessas pessoas na empresa, com o objetivo de cumprimento da cota e promoção da inclusão social. Além de “SER”, é importante “PARECER”, ou seja, registrar de forma adequada o que está sendo feito. Não basta acreditar que conseguirá provar no judiciário que as suas atividades são impossíveis de admitir algum empregado com deficiência, pois o entendimento do legislador foi para que as empresas se esforçassem, numa postura mais proativa. Nesse sentido, citamos também a decisão proferida em dezembro no processo nº 1559-68.2018.5.12.0012.

Recomendamos, particularmente, que haja sempre a formação de um grupo de inclusão social multidisciplinar para a organização dessas ações, bem como parcerias com entidades voltadas à inclusão e apoio às pessoas com deficiência. É sempre muito válida a participação do jurídico nesses grupos, diante das diversas previsões legislativas específicas no tema. A própria fiscalização do trabalho prevê a possibilidade de se firmar Termos de Compromisso (pactos com o Ministério da Economia) para a inclusão social, sendo que muitas empresas acabam querendo distância da fiscalização em vez de se aproximar e expor as suas dificuldades.

No ano de 2020 o Governo ratificou a sua preocupação com ações afirmativas e o seu pacto com a inclusão social quando, durante o estado de calamidade pública, proibiu que as empresas dispensassem sem justa causa qualquer pessoa com deficiência (vide Lei nº 14.020/2020, art. 17, V) Essa restrição se sobrepôs à regra ordinária de prévia contratação de outra pessoa com deficiência ou reabilitado antes da dispensa sem justa causa ou rescisão de contrato de prazo determinado de mais de noventa dias de empregado com deficiência ou reabilitado (art. 93, §1º, da Lei nº 8.213/1991), regra essa que não foi revogada e continua vigente.

Vale ressaltar que, em teoria, a proibição de dispensa sem justa causa da pessoa com deficiência durante o estado de calamidade pública já não estaria em vigor, uma vez que o Decreto Legislativo nº 6/2020, referenciado pela Lei nº 14.020/2020, vigorou somente até 31/12/2020.

No entanto, considerando a continuidade da pandemia de Covid-19, a qual foi o fundamento fático para a vedação da dispensa sem justa causa da pessoa com deficiência (mesmo quando haja a prévia substituição), a postura mais cautelosa é a de, por ora, seguir observando essa vedação. Eventuais situações críticas deverão ser analisadas caso a caso, levando em conta a legislação da localidade, cenário de fiscalização, dentre outros aspectos, com a devida documentação.

Assim, é essencial que as empresas organizem e documentem as ações acima tratadas, a fim de poderem demonstrar aos órgãos fiscalizadores e ao judiciário sua boa-fé e esforços realizados no cumprimento da cota legal, para defesa contra eventuais penalidades.

Autores: Luiz Eduardo Amaral de Mendonça e Rosana Yoshimi Tagusagawa, sócios da área Trabalhista do escritório FAS Advogados.