Marketing ágil: descoberta, aprendizado e cocriação

O conceito fomenta a necessidade de traduzir insights e expectativas dos clientes em experimentos.

Sylvio Leal Barbosa (*)

Incorporar princípios ágeis nas atividades dos times de marketing pode ser um bom sinal, mas é preciso avaliar se outros departamentos conseguem acompanhar o ritmo. Quanto tempo uma decisão para realocação de recursos demora? A TI consegue se engajar amanhã em um novo projeto definido em uma reunião de Growth realizada hoje?

Ter um marketing ágil significa responder a sinais de mercado de forma rápida, ou ao menos mais rápido que seus concorrentes. Pesquisas de mercado e conhecimento de terceiros têm seu valor para tomada de decisão, entretanto, nada substitui o contato direto com o cliente. Vivemos a era da experiência e a percepção que ele tem da sua marca é fundamental para mantê-lo como cliente.

A entrega de um projeto, produto ou serviço precisa ir além de uma boa nota de NPS. É bem mais fácil implementar uma nova metodologia para mensurar a satisfação do cliente do que mudar o comportamento das pessoas. O perigo aqui é seguir pelo caminho mais fácil. A tão falada transformação do mindset ágil encontra aqui um dos seus principais desafios: todos na organização precisam ver o cliente como a principal fonte de feedback para tomada de decisão. Muitas vezes, esta atitude fica mais no discurso do que na prática.

Capacidade (agilidade) de selecionar experimentos

Considerando a proximidade com o cliente uma premissa, o próximo desafio está em realizar uma escuta seletiva. Ouvir o cliente não significa necessariamente sanar todas suas dores, realizar suas vontades ou atender a suas recomendações. Significa traduzir seus insights e expectativas em experimentos: testar novas combinações de produtos e serviços; aprimorar serviços e produtos existentes; incorporar novos produtos ou serviços ao portfólio da organização; testar novos modelos de negócio, precificação, entrega, dentre outros. A escuta seletiva implica em se propor ao desafio: desenvolver a habilidade de captar sinais e desenvolver alternativas estratégicas com base no conhecimento de mercado advindo do contato direto com o cliente, e ao mesmo tempo, se manter fiel à proposição de valor da organização.

Se a capacidade de responder a estímulos, primeiro ponto discutido neste artigo, está relacionada a uma mudança de mindset e ao compromisso assumido pela liderança da organização, o desenvolvimento de experimentos tem um caráter mais tático e, necessariamente, passa pela incorporação de novas ferramentas de gestão.

Incorporar princípios e práticas de Growth Haking pode ser um caminho a seguir. Em um time crescimento, é preciso ter todos à mesa: marketing, TI, líderes de produto, UX, cientista de dados, compras, entre outros. É preciso incorporar práticas de Growth à rotina das equipes: livre ideação para captura de possíveis experimentos; processo de validação e priorização de experimentos e execução dos experimentos em uma frequência que garanta velocidade no aprendizado. A frequência de experimentação, em última instância, é o instrumento que aproxima efetivamente a organização de seu mercado e ajuda a quebrar o paradigma da visão do cliente como um elemento externo à organização, possibilitando colocar em prática na rotina dos times a tão falada cocriação com o cliente.

Gestão criativa e liderança engajada (ágil)

O marketing efetivamente ágil precisa de uma liderança também com mindset ágil, pronta para disponibilizar e rearranjar recursos de forma rápida, sem burocracia. A liderança precisa estar disposta a desafiar a forma tradicional de gestão, preferir o simples ao complexo, dar mais valor aos dados e menos as opiniões. Precisa ceder e descentralizar poder. Visibilidade e comunicação aberta são elementos-chave desta mudança. A liderança de organizações já consolidadas, ao invés de temer a agilidade das startups, devem alavancar os ativos valiosos que possui, tais como clientes, marca, recursos financeiros e dados históricos.

Este novo olhar da liderança é também o caminho para a organização conseguir se preparar para se inserir em outros arranjos organizacionais, arquitetados para lidar com empresas que compartilham destes princípios. Os ecossistemas de inovação aberta, por exemplo, que buscam resolver desafios de forma mais rápida, com menos esforço e capital, são realmente efetivos quando a empresa está preparada para interagir nestes ambientes.

Se sua organização está disposta a se transformar, é preciso também um olhar atento para as tecnologias sociais (sistema de governança organizacional), e como elas podem ajudar a sua organização a ser tornarem mais adaptativas e auto-organizadas. Não é possível saber qual será a estrutura organizacional ideal para se trabalhar neste novo cenário, porém é fundamental ter uma estrutura que seja adaptável, capaz de auto-organizar conforme os desafios se apresentam.

O marketing ágil tem um enorme potencial de benefícios. É uma abordagem de fora para dentro: o cliente, parceiros e outros atores atuando como seu instrumento de escuta. É o marketing baseado na descoberta, aprendizado e cocriação. O valor precisa, em última instância, ser definido e validado pelo mercado.

(*) Sylvio Leal Barbosa é Marketing Leader na Stefanini Brasil