Só quem sente na pele pode resolver os problemas!

*Por Katrine Marçal

Katrine Marçal Foto: Alta Books Editora

O mercado global de ajuda à mobilidade foi avaliado em 2,2 bilhões de dólares. Número que deve crescer rapidamente nas próximas décadas, conforme a população fica mais idosa e nossa percepção da velhice muda.

Nesse contexto de mudanças, invenções como as de Aina Wifalk, criadora do andador com rodas, em 1978, teve e ainda tem um grande impacto no mundo. Mas não se pode dizer o mesmo do impacto na própria conta bancaria da inventora. Ela contraiu pólio na juventude, o que mudou drasticamente todos seus planos de vida. Ao mesmo tempo, a fez pensar sobre como andar pelo mundo, diante das limitações motoras.

Hoje, não existe uma fundação “Wifalk” de subvenções a empreendedores que tenham deficiências ou que financie pesquisas para projetos de acessibilidade. Afinal, o pouco dinheiro ganhado por Aina Wifalk com a invenção, foi deixado como legado para a igreja sueca da Costa do Sol.

Aina Wifalk, criadora do andador com rodas. Foto: Winnet Västmanland/TT

O problema de Aina Wifalk era que não tinha posses, o que significava que não conseguia fazer sua ideia render dinheiro. Sim, ela conseguiu produzir um ou dois andadores com rodas para si mesma, melhorou o design com algumas prateleiras de geladeira e passeou com eles para cima e para baixo pelas ruas de Vasterás seguindo a rotina diária.

Porém, para tornar isso um produto de exportação que pudesse ser lançado globalmente, seria necessário uma soma muito maior de dinheiro que ela não tinha. Nem parecia haver alguém que quisesse investir nela. E Aina tinha perfeita consciência disso: “Quem iria me escutar, uma senhora com deficiência no meio de todos os rapazes?”

E, ainda por cima, ela nunca patenteou o andador com rodas. Em vez disso, vendeu sua ideia por algo equivalente a 750 libras nos dias de hoje e royalties de 2% nas vendas daquele produto em particular. Mais tarde admitiu que “quase foi boa demais.” Uma forma de reconhecer a oportunidade tirada.

Hoje é provável que alguém lhe indicasse um curso de empreendedorismo feminino, lhe dissesse para “aceitar o desafio”, “fazer sua voz ser ouvida” e “acreditar em si mesma”. Talvez lhe desse um livro de técnicas de negociação ou ajudasse a montar um pitch excelente.

No entanto, não se trata disso, mas de todo o sistema financeiro. E de como ele exclui sistematicamente as ideias das mulheres.

Katrine Marçal é jornalista e escritora, autora da obra “Mãe das invenções”, da Alaúde Editora.