*Por Roberto Dranger

Nos últimos anos, um movimento estratégico vem ganhando cada vez mais força no ecossistema de negócios brasileiro: a transição de executivos seniores, com passagem pela alta liderança de grandes corporações, para o universo dinâmico das startups. Esse fluxo não é uma simples troca de carreira, mas um sinal claro de uma nova fase, mais madura e sustentável, para o empreendedorismo nacional.
Por muito tempo, houve uma mentalidade atrasada de que corporações e startups faziam parte de mundos opostos. De um lado, a solidez, os processos estabelecidos e a busca pela eficiência. De outro, a agilidade, a ousadia e a busca pela disrupção a qualquer custo. Essa imagem, porém, já não reflete a realidade. A fronteira entre esses dois ambientes está se dissolvendo, e a experiência acumulada na chamada C suite tornou-se um ativo valioso para empresas em crescimento.

O que motiva essa migração?
Para as startups que superaram a fase de validação inicial, os desafios evoluem. A questão deixa de ser “como criar um produto viável” e passa a ser “como escalar operações, atrair investimentos e estruturar uma gestão profissional para suportar o crescimento”. É nesse momento que a bagagem de um executivo que já navegou em águas complexas se torna um diferencial crítico. Eles trazem não apenas um network qualificado, mas a visão estratégica para evitar armadilhas e consolidar a expansão.
Essa influência redefine a cultura interna das startups. Conceitos antes vistos com desconfiança, como governança, métricas aprofundadas e planejamento de longo prazo, passam a ser encarados como alicerces para a escalabilidade, e não como entraves à criatividade. A agilidade típica das startups é potencializada quando apoiada em bases sólidas de gestão.

Contudo, essa é uma via de mão dupla, com ganhos para ambos os lados. Para muitos desses executivos, a mudança representa uma renovação profissional. Longe das hierarquias rígidas e das rotinas previsíveis, eles redescobrem o prazer de construir algo do zero, de testar novas ideias e de aprender com os erros em um ciclo acelerado. Esse encontro entre a experiência consolidada e a energia disruptiva gera um rico intercâmbio, onde todos saem ganhando.
O impacto vai além das empresas individuais
Um dos efeitos mais significativos é o fortalecimento da governança corporativa no ecossistema de inovação. Startups que adotam práticas de transparência, contam com conselhos administrativos atuantes e estabelecem critérios claros para a tomada de decisão geram maior confiança em investidores e parceiros estratégicos. Em um mercado ainda marcado por incertezas, essa maturidade é um poderoso ativo competitivo.
O Brasil anseia por inovação, mas precisa, sobretudo, de empresas inovadoras que sejam construídas para durar. A integração entre o know how corporativo e o espírito empreendedor é um ingrediente fundamental nessa equação. Quando a sabedoria de quem já geriu grandes negócios se encontra com a audácia de quem está construindo o novo, o resultado vai além de uma boa ideia: é a fundação de uma empresa mais resiliente e preparada para o futuro.
Essa pode ser a transformação mais subestimada da economia brasileira na última década. Uma nova geração de líderes, ágil e com profundidade estratégica, está surgindo na intersecção entre a corporação e a startup. E é dessa síntese que pode nascer o verdadeiro diferencial competitivo do país.
Roberto Dranger é sócio-fundador da Átina Consulting.




